segunda-feira, 19 de março de 2012

Última Palavra: A Motivação Correta Para o Casamento

Por: Pedro Arruda

De maneira geral, admitem-se três possibilidades como motivação para o casamento:
(1) casar para ser feliz;
(2) casar para fazer o outro feliz;
(3) casar para responder à vontade de Deus.

Poucos assumem a primeira possibilidade, pois ela explicita o egoísmo. A segunda dá um tom mais nobre, mas, no fundo, também pode estar contaminada com o mesmo egoísmo, embora mais sutil, uma vez que, se o outro for feliz, isso também me fará feliz. De qualquer forma, ambas se mostram falsas, já que ninguém tem o poder de fazer o outro feliz. A única fonte legítima de felicidade está em fazer a vontade de Deus que é boa, agradável e perfeita. A felicidade não é algo que se pode buscar ou conquistar, mas apenas desfrutar como consequência do nosso procedimento, à medida que somos autênticos em viver de forma que atenda às expectativas de Deus a nosso respeito.

Ninguém é fruto do acaso, pois nossa existência é resultado de uma intenção do Criador (Sl 139). Viemos ao mundo para cumprir um propósito divino, para o qual somos capacitados por Deus (At 17.24-28). O casamento é um dom de Deus e um dos principais recursos para nos capacitar para nossa missão (Mt 19.11). É assim desde o princípio, pois Adão teria sido incapaz de cumprir sua missão de multiplicar-se, encher a terra e dominar sobre ela se Deus não lhe houvesse providenciado Eva para o casamento. Portanto, o casamento não é um fim em si mesmo, mas faz parte da vocação pessoal. Apesar disso, não deve ser encarado como uma obrigação, pois, embora não seja sua finalidade primária, a felicidade vem infalivelmente a todos os que o fundamentam nos propósitos de Deus.

Somente o homem que conhece a sua missão pode ter uma companheira em submissão. Saber o que vai fazer na vida é condição sem a qual é impossível guiar a si mesmo e, pior ainda, pretender guiar outros que lhe sejam atrelados. Esse conhecimento antecede a escolha do cônjuge, pois é preciso saber se o candidato está disposto a trilhar o mesmo caminho. Muitos, em sua ânsia de conquistar o parceiro, oferecem um caminho imaginário, feito somente de coisas boas com conquistas inalcançáveis, criando falsas expectativas que jamais poderão ser cumpridas.

Isso é a frustração já previamente decretada.

“Conhece-te a ti mesmo”, ensinava o filósofo Sócrates. Entretanto, somente quem nos criou pode revelar nossa verdadeira identidade. Ou seja, somente somos verdadeiros à medida que somos o que Deus pensou ou planejou para nós. Isso requer “olhar para nós mesmos com o olhar de Deus”. Do contrário, ficamos sujeitos à arrogância humana com a pretensão de cumprirmos um papel que não nos foi designado, vivendo uma mentira.

Comumente, pensamos em vocação como um chamado de Deus para fazer algo restrito ao que denominamos de atividade ministerial. Entretanto, encontrar a vocação significa descobrir a razão para a qual nascemos, abrangendo a vida como um todo. Não é apenas algo a ser feito, mas o motivo de nossa vida, em conformidade com o que Deus propôs para ela.

Os dons que o Senhor nos confiou estão diretamente ligados à nossa missão. É uma questão de mutualidade e não de conflito. Assim sendo, o casamento não faz competição com o ministério ou qualquer outro projeto na vida, mas antes de tudo é um recurso essencial à realização de nossa vocação.

Devemos ter em conta que, numa mesma escolha, se incluem o cônjuge e o parceiro de ministério como instrumento que Deus certamente usará para nos dotar de sua mentalidade. A prioridade de Deus é transformar nosso coração para que se torne semelhante ao dele, independentemente das nossas realizações, ou seja, do sucesso que pode ser mensurado numericamente. Atitudes contrárias ou indiferentes que o cônjuge pode apresentar não devem ser interpretadas apenas como oposição ao ministério ou um obstáculo a ser superado, sob o risco de se desprezar o mais eficiente recurso de Deus para nosso quebrantamento, o que evitará o orgulho. Então, até mesmo a oposição do cônjuge deve ser motivo de louvor a Deus, pois “crer em Cristo significa também pensar como ele. Isto é, vencer perdendo, viver morrendo, receber doando”.

Sabemos que todas as coisas, sem exclusão daquelas que nos parecem desagradáveis, contribuem para o bem daqueles que amam a Deus e que são chamados segundo o seu propósito (Rm 8.28). Contudo, elas estão atreladas ao propósito de Deus e não às nossas intenções particulares. Isso deve nos causar ainda mais “temor e tremor” (Fp 2.12) na hora de escolher o cônjuge, já que não estamos escolhendo alguém para fazer nossa vontade e, sim, a vontade de Deus. Nossa expectativa no casamento é alcançar a satisfação de Cristo acima da nossa, pois a satisfação dele é a única capaz de resultar em felicidade pessoal.

Ao sujeitar a escolha do parceiro à vontade de Deus, muitos receiam que isso venha anular a própria vontade ou que exclua o romantismo do relacionamento. Porém, se considerarmos que “a vontade de Deus não pode ser diferente daquilo que ele é, ou seja, o seu querer não pode separar-se da sua natureza que é amor”, esses temores cairão por terra. Como pode alguém que se diz romântico, querer evitar a participação de Deus que se revela romântico por excelência?

Nota: este texto está, em grande parte, baseado no livro O Caminho da Vocação Cristã, de Marko Ivan Rupnik, Editora Edusc, do qual foram extraídas e adaptadas as frases entre aspas e destacadas em itálico. Trata-se de uma obra no estilo de O Monge e o Executivo, na qual um casal de noivos recebe aconselhamento para encontrar a vontade de Deus, com a liberdade de expor seus conflitos existenciais e espirituais sobre esse assunto. É uma leitura que recomendamos a todos, pois o seu benefício vai muito além daqueles que estão nesta fase da vida.

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